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quarta-feira, 11 de setembro de 2019

Perfil dos alimentos e bebidas com publicidade restrita a menores de 16 anos


Definido o perfil dos alimentos e bebidas com publicidade restrita a menores de 16 anos

O perfil nutricional dos alimentos e bebidas que passam a ter restrições à publicidade a menores de 16 anos foi publicado no Despacho n.º 7450-A/2019, de 21/08.
O perfil nutricional surge no seguimento da lei aprovada em abril, destinada a restringir determinada publicidade dirigida a crianças. A lei então aprovada incumbia a Direção-Geral da Saúde (DGS) de identificar os produtos alimentares com elevado valor energético, teor de sal, açúcar, ácidos gordos saturados e ácidos gordos ‘trans’.
Na prática, a partir de outubro, a publicidade dirigida a menores de 16 anos vai sofrer alterações significativas: bolachas e leites achocolatados, 90% dos cereais de pequeno-almoço e 72% dos iogurtes no mercado não vão ser publicitados perto de escolas e parques infantis e vão sair dos ecrãs, redes sociais, televisão e rádio.
As novas regras publicitárias têm por base limites que seguem as recomendações da Organização Mundial da Saúde e a legislação da União Europeia, bem como a mais recente evidência científica. Nela inserem-se categorias de produtos como chocolates, barras energéticas, bolos e outros produtos de pastelaria cuja publicidade será limitada se excederem as 40 kcal ou integrarem na sua composição mais de 5 gramas de açúcar ou 1,5 gramas de ácidos gordos saturados por cada 100 gramas. Estes são os valores-limite definidos para estas categorias, porém estes valores diferem entre as diferentes categorias de produtos alimentares.
De acordo com uma análise da DGS, nenhum produto na categoria de bolachas e leites achocolatados e aromatizados vendidos em Portugal «está apto para publicidade dirigida a menores de 16 anos». Na lista há ainda manteiga, queijos, pão, preparados de carne e conservas.
A tabela que define os valores-limite a considerar na identificação destes produtos surge no seguimento da Lei n.º 30/2019, de 23 de abril, que incumbe a Direção-Geral da Saúde de identificar os géneros alimentícios que contenham elevado valor energético, teor de sal, açúcar, ácidos gordos saturados e ácidos gordos trans. Esta lista vem concretizar as alterações ao Código da Publicidade, com o objetivo de desincentivar o consumo deste tipo de produtos e incentivar uma alimentação variada, equilibrada e saudável nas crianças portuguesas.
A lista é exaustiva, abrangendo o leite achocolatado ou aromatizado, iogurtes, manteiga, queijos, pão, refeições pré-preparadas, bolachas, cereais de pequeno-almoço, preparados de carne ou conservas que ultrapassem os limiares definidos. Entre as bebidas estão refrigerantes, néctares e sumos de fruta, que não podem exceder as 20 kcal ou 2,5 gramas de açúcar. Acima destes valores não será autorizada a publicidade a menores de 16 anos junto de escolas e parques infantis, no cinema, na internet e em programas televisivos e de rádio para audiências específicas e em determinados períodos. 
Com esta medida, o Governo prossegue o objetivo de reduzir o consumo excessivo de sal, açúcar e gorduras saturadas, que estão associados ao desenvolvimento de doenças crónicas, em especial obesidade, doenças cardiovasculares e doenças oncológicas.
Poderá ter acesso a mais informações aqui. 

quarta-feira, 31 de julho de 2019

Alimentação no 1º ano de vida: conheça o seu filho.


Introdução
Pretende-se divulgar recomendações relativas à alimentação no primeiro ano de vida em geral e em particular à idade de início e tipo de alimentos a introduzir tendo por
base a evidência científica, relativamente a efeitos a curto e longo termo para a saúde.

Igualmente se pretende ajudar os pais, os familiares e a população em geral a reflectirem sobre as razões, aparentemente inexistentes ou insondáveis de comportamentos alimentares dos bebés e crianças.

O aleitamento materno
Para a Organização Mundial de Saúde, aleitamento materno exclusivo significa que o lactente recebe unicamente leite materno e nenhum outro líquido ou sólido à excepção de gotas ou xaropes de vitaminas, suplementos minerais ou fármacos.
O aleitamento será predominante, se além do leite materno o lactente receber outros líquidos não lácteos, tais como água e chás sem conteúdo energético. Um e outro representam o aleitamento materno total. O aleitamento será misto, se além do leite materno o lactente receber uma fórmula infantil e será parcial se o aleitamento materno for acompanhado de alimentação complementar.
Embora o desejável seja o aleitamento materno exclusivo durante o primeiro semestre de vida, o aleitamento por um menor período ou o aleitamento parcial têm também um efeito benéfico. É ainda desejável que o aleitamento materno prossiga ao longo de todo o programa de diversificação alimentar e enquanto for mutuamente desejado pela mãe e lactente.
Múltiplos estudos científicos registam uma associação do aleitamento materno a um menor risco de otite média, gastroenterite aguda, infecções respiratórias baixas severas, dermatite atópica, asma, obesidade, diabetes de tipos 1 e 2, leucemia, síndrome de morte súbita no lactente e enterocolite necrotizante. Não se registou nenhuma associação entre o aleitamento materno em recém-nascidos de termo e o desempenho cognitivo.

Aspectos biológicos e de desenvolvimento associados à diversificação alimentar
1. Maturação fisiológica e neurológica
A maturação fisiológica da função gastrintestinal e renal é necessária para uma adequada digestão, absorção e metabolização dos alimentos para além do leite. De igual modo a evolução maturativa do neuro-desenvolvimento representa um processo necessário para uma progressão segura do plano de diversificação alimentar até à alimentação familiar.
É consensualmente reconhecido que do ponto de vista da evolução maturativa, o lactente normal de termo esteja preparado para o início da diversificação alimentar a partir dos 4 meses de vida.
Aos 4 meses o lactente ganha uma maior estabilidade maxilar e do pescoço e o padrão primitivo de sucção começa a modificar-se.
Entre os 5 e os 8 meses ocorre uma transição progressiva das funções oromotoras com a passagem da sucção para a mastigação.
A partir deste período o lactente desenvolve assim a capacidade de mastigação devendo esse processo ser estimulado de modo a facilitar a integração na alimentação familiar.
Há um período crítico para a introdução de sólidos na alimentação do lactente. Se a sua introdução não ocorrer até aos 10 meses, aumentará o risco de dificuldades na alimentação com impacto negativo nos hábitos dietéticos em idades posteriores.

2. Aspectos nutricionais
A evidência científica tem demonstrado benefícios para a saúde com o aleitamento materno exclusivo durante os primeiros 6 meses de vida. A partir desta idade o volume de leite ingerido é insuficiente, não sendo possível suprir adequadamente as necessidades energético-proteicas e em micro nutrientes. É assim necessário diversificar a alimentação a partir dos 5-6 meses de vida tendo em conta aspectos nutricionais e de desenvolvimento do lactente de modo a suprir adequadamente em nutrientes o lactente e a permitir uma transição entre a alimentação láctea exclusiva e a alimentação familiar.
A limitada evidência científica relativamente ao processo de diversificação alimentar reflecte-se em consideráveis diferenças entre as recomendações alimentares nos diferentes países.
Aspectos relacionados com culturas e tradições regionais justificam também essas diferenças.

3.A influência precoce das preferências alimentares
O aforismo “nós somos aquilo que comemos” é frequentemente utilizado para sublinhar o papel relevante da alimentação no desenvolvimento e bem estar do ser humano.
Se efectivamente somos aquilo que comemos então algo de errado se passará com a nossa alimentação, já que a taxa de excesso de peso e obesidade atinge cerca de um terço de adolescentes. Apesar de preocupante em si mesma, o grande problema associado à obesidade é a sua íntima correlação com a síndroma metabólica (conjunto de fatores de risco, essencialmente cardiovasculares, que têm por base a obesidade abdominal, em que os indivíduos portadores têm elevada probabilidade de desenvolver doença cardiovascular -ataque cardíaco e AVC- e diabetes, mesmo quando os fatores de risco estão apenas ligeiramente elevados), cuja incidência está também a aumentar na idade pediátrica.
Por outro lado, desde muito cedo nos habituamos a comer aquilo que comemos, como demonstram estudos em que a concordância de preferência para a maioria dos sabores se mantém entre os 2-3 anos e os 8 anos, com valores altos para pão, massas, sobremesas e valores baixos para fruta e vegetais crus ou cozinhados.
Muitos dos nossos comportamentos alimentares resultam de milhões de anos de evolução e programação genética. Foram-se seleccionando genes que determinavam comportamentos alimentares específicos, como a preferência pelos doces (maiores fornecedores de calorias), em detrimento dos amargos ou ácidos (associados a toxinas de plantas, principalmente alcalóides), bem como a preferência pelos alimentos gordos ou derivados da carne. Hoje, tal como nesse passado remoto, o bebé humano nasce com um gosto inato para o doce e uma aversão ao amargo. A preferência pelo salgado vai-se desenvolvendo a partir do segundo semestre de vida. O reconhecimento dos sabores é modulado por receptores localizados nos botões gustativos da língua e palato (TAS1 para os doces, TAS2 para os amargos).
Há estudos interessantes que põem em evidência que a sensibilidade ao sabor ácido tem uma base hereditária, embora não sejam conhecidos ainda os receptores ou os seus genes. Estudos em famílias demonstram que o gosto pela fruta se desenvolve progressivamente dos 6 aos 18m e se correlaciona positivamente com a capacidade de aceitar sabores mais ácidos (entre os 12-18m) e com a influência das mães. Por outro lado a sensibilidade ao sabor salgado parece depender mais de factores ambientais de exposição que de factores hereditários. Sabe-se que em crianças o interesse pelo salgado aumenta a partir do 2º semestre de vida até atingir um pico pelo 3-4 anos. A exposição mais precoce aumenta também o interesse por esse sabor. Curiosamente há estudos que revelam uma preferência pelo sabor salgado em crianças cujas mães sofreram de hiperemesia gravídica (caracterizada por náuseas e vómitos de tal forma graves que provocam perda de peso e desidratação) ou que apresentaram baixo peso à nascença.
A relutância em aceitar novos sabores (neofobias alimentares), que se acentua a partir do 1º ano de vida (o que, num momento em que a criança começa a deambular e mais exposta a possíveis alimentos tóxicos no seu ambiente, poderá ter trazido claras vantagens evolutivas) é um traço em que a hereditariedade desempenha um papel determinante. No entanto aqui também o tipo e textura do alimento condiciona o maior ou menor grau de neofobia, ou seja as crianças neofóbicas são-no preferencialmente para alimentos como a carne, vegetais ou frutas e menos para alimentos doces ou ricos em gordura. Conhecendo estes mecanismos que a evolução e seleção natural foi apurando é pois mais apropriado dizer que nós atualmente comemos o que somos ou, mais precisamente, que somos o que comemos há milhares de anos atrás. Estaremos então condenados pelos nossos genes a uma dieta monótona com os riscos que isso significa para o futuro (excesso de calorias, ingestão de substâncias potencialmente nocivas)? A resposta é não, porque podem contrariar-se os mecanismos inatos de preferência alimentar, através da experiência precoce, da familiarização com o sabor e da variedade alimentar.
Os botões gustativos estão completamente formados no feto pela 15ª semana de gestação e pela 25ª já parece haver neurónios olfactivos funcionais. Assim o feto está precocemente equipado para reconhecer sabores voláteis da dieta materna, entretanto transferidos para o líquido amniótico, quer através da deglutição, quer através da inalação deste. Esta capacidade de reconhecimento precoce de sabores presentes na dieta da grávida traduz-se em níveis de aceitação mais fácil dos mesmos quando administrados aos bebés frutos dessas gestações, na altura da diversificação alimentar, como bem ficou patente em estudos científicos. Outros trabalhos põem ainda em evidência a importância da passagem desses mesmos sabores através do leite materno, conferindo ao lactente amamentado uma maior capacidade para se adaptar à diversificação alimentar, nomeadamente a sabores de frutos e vegetais, desde que as mães os consumam enquanto amamentam.
Não fazem pois sentido as restrições em termo de alimentação (sobretudo quando incluem alimentos saudáveis) a que as mães que amamentam se impõem, por motivos variados que vão do medo das alergias à hipotética possibilidade de determinado alimento ingerido ser actor de cólicas no bebé, como o demonstra um estudo, em que 89% das mães que amamentaram eliminaram nesse período, na sua alimentação, um conjunto de produtos que incluía as couves, os feijões e as laranjas. A capacidade do bebé aceitar novos sabores, principalmente se amargos ou ácidos (vegetais e frutas) vai aumentando gradualmente à medida que se vai familiarizando com esse sabor e muitas vezes são precisas em média 11 tentativas para finalmente ter sucesso, pelo que se deve encorajar a persistência na oferta alimentar.
Uma outra estratégia de aceitação de sabores passa também pela variedade, precoce, dos alimentos oferecidos, sobretudo no campo dos vegetais, que induz nos bebés uma maior capacidade de gostar à primeira de alimentos que nunca haviam experimentado. É interessante verificar como estas estratégias aparentemente antagónicas funcionam igualmente bem e dependem muitas vezes de práticas culturais das sociedades, como ficou demonstrado num estudo em duas regiões equivalentes em França e na Alemanha, em que no primeiro destes países as mães preocupadas com a qualidade do sabor apresentam uma extrema variedade de vegetais com boa aceitação, ao contrário da Alemanha, com uma dieta mais monótona, em que o sabor acaba por ser aceite pela persistência com que é oferecido.
Estes factos demonstram que apenas a estratégia de “se não gosta não ofereço e só lhe apresento o que sei que ele gosta “ é que não funciona para a aquisição de uma paleta mais variada de alimentos.
Estes aspectos são tanto mais importantes quanto se sabe que a janela para a habituação aos sabores é estreita, começando a fechar-se pelos 2 anos e encerrando aos 3 anos, ou seja uma criança com um portfolio alimentar reduzido pelos 3 anos, vai manter essa monotonia alimentar até à adolescência, consumindo geralmente uma dieta rica em calorias mas pobre em nutrientes.
Hoje já não é a modificação genética a principal causa da adaptação às mudanças ambientais. Essa adaptação resulta da modificação de comportamentos aprendidos pela divulgação de informação.
Para induzir a modificação do comportamento alimentar (geneticamente determinado), os memes são hoje de primordial importância: positivos quando encorajam a variedade; negativos quando, por medos cientificamente pouco explicados (como por exemplo, o receio de alergias) afunilam a experiência alimentar e tornam ainda mais desajustado o nosso património genético ao ambiente em que ele se desenvolve.
Atentas a este facto, as últimas recomendações da American Academy of Pediatrics (AAP)  e da European Society for Paediatric Gastroenterology Hepatology and Nutrition (ESPGHAN) para a diversificação alimentar recusam o fundamentalismo alergológico e enfatizam o valor do aleitamento materno e da experiência precoce da variedade de sabores, descartando respectivamente dietas hipoalergénicas nas grávidas ou mães lactantes (como inúteis ou mesmo perniciosas) e o atraso na introdução de alimentos tradicionalmente considerados alergénicos, mesmo em famílias de risco.
Como médico, orientado para a prevenção, em que não estou apenas a velar pela saúde da criança, mas muito principalmente pela da do adulto em que se tornará, não devo e não posso estar alheio a estes aspectos e devo promover práticas conducentes ao alargamento atempado da experiência alimentar.






Nota: Elaborado por Aristides Sousa, Médico de Saúde Pública, Coordenador da Unidade de Saúde Pública Barcelos/Esposende.  Fotografia do topo da notícia obtida a partir do banco de imagens grátis pixabay.